🌳COP27: A revolução da valorização financeira da Floresta Amazônica

6 de novembro de 2022

Em meio às discussões que tomarão os palcos da COP27, que neste ano acontece no Egito, fala-se muito de meio ambiente e sustentabilidade, mas ainda poucos atentam para uma verdadeira revolução que está em curso na Amazônia. Trata-se de um intenso e acelerado processo de valorização financeira da floresta. Essa dinâmica é uma das ferramentas mais importantes para o combate às mudanças climáticas, solução que é um ativo muito importante para o Brasil. Em outras palavras: a evolução dos créditos de carbono está ajudando a tornar mais vantajoso manter a floresta de pé do que derrubada, quebrando o círculo pernicioso em que a desvalorização dos espaços na Amazônia favorece o desmatamento.

Há muitos componentes nessa revolução. Um deles é a enorme magnitude dos projetos de conservação. Alguns atingem cerca de 150 mil hectares, o tamanho da cidade de São Paulo. A remuneração de uma área desse porte tende à média de R$ 500 por hectare por ano (R$ 45 milhões anuais). A disseminação desse dado é vital para o incentivo ao trabalho de conservação e venda de créditos de carbono relacionado à região Amazônica.

Paralelamente, estão sendo tocadas diversas iniciativas de monitoramento e mapeamento do Brasil, todas com excelência global. Infelizmente, elas ainda são pouco conhecidas do público geral. Vale mencionar, por exemplo, o MapBiomas. É uma iniciativa do Observatório do Clima, cocriada e desenvolvida por uma rede multi-institucional (formada por universidades, ONGs e empresas de tecnologia) com o propósito de mapear a cobertura e o uso da terra do Brasil e monitorar as mudanças no território do país.

O MapBiomas mapeia e valida, com um minucioso trabalho de campo, aspectos do território e da vegetação como densidade, quantidade de carbono e uso do solo. O resultado constitui uma ferramenta fundamental para que desenvolvedores de softwares e soluções tecnológicas para a Amazônia (como o monitoramento via imagens de satélite) consigam auditar e verificar a conservação e geração de ativos ambientais. Sem dúvida, a imagem do Brasil em conservação e em questões ambientais ganha muito com o conhecimento gerado por projetos como o MapBiomas.

Do lado do governo, destaque para a atuação do BNDES, que já fez duas licitações — uma primeira de R$ 10 milhões e uma segunda, em outubro de 2022, de R$ 100 milhões — para venda de créditos gerados futuramente via contratos “offtake” (compromissos de compra a preço fixo). Essas compras não só validam com um ente público o modelo de créditos de carbono: mitigam significativamente o risco de colocação dos eventuais créditos — e, portanto, beneficiam o retorno dos projetos de conservação.

Na iniciativa privada, tem sido registrada grande destinação de recursos para projetos ligados à agenda de créditos de carbono. Recentemente, empresas do setor de petróleo, como a Shell, e grandes bancos, como o Santander, têm investido em desenvolvedores e financiado os custos da certificação. Estima-se que US$ 100 milhões já estejam empregados na compra de empresas e financiamento do setor. Isso significa que uma das principais barreiras — o acesso a capital — está se reduzindo drasticamente.

O principal gargalo do processo de certificação e valorização das florestas via créditos de carbono está na combinação de duração e custo da certificação. O processo ainda é muito burocrático e manual — portanto, muito caro (mais de US$ 1 milhão por projeto, independentemente de sua área) e inacessível para a maior parte dos brasileiros. A boa notícia é que o uso da tecnologia — como imagens de satélite de menor custo e maior resolução, big data de bases de dados do governo federal para questões ambientais e fundiárias, automação de processos e uso de inteligência artificial para leitura de mapas e preparo de informações e documentos para a auditoria e certificação — tem levado a solução de carbono a escalar e a tornar-se mais acessível.

Seguindo premonição de Alfredo Sirkis, grande ambientalista, jornalista, ativista e político brasileiro, falecido em 2020, o uso de blockchain para segurança e transparência em transações de crédito de carbono também é uma melhoria que veio para ficar e facilitar a emissão e transações de carbono. Visionário, Sirkis disse* em 2019:

“Se governos, bancos centrais e agências multilaterais são incapazes de fazê-lo, temos que criar uma criptomoeda do clima. Uma baseada no lastro do menos-carbono como se fosse o novo ouro. É algo muito mais factível e útil que o bitcoin e, se governos, bancos centrais e agências multilaterais não conseguem — ou não querem — fazê-lo, caberá à própria sociedade, aos hackers, aos popstars iniciarem um movimento global pela internet. Se a mudança climática é o maior problema da humanidade e está ficando cada dia mais dramática, o menos-carbono é o novo ouro”.

Recentemente, os maiores registros globais de créditos endossaram a adoção dessa tecnologia. Para o Brasil, isso é uma dádiva: a monetização dos ativos naturais do país, gerando remuneração e retorno socioeconômico para os guardiães da floresta. Em tempo, cabe lembrar que há várias empresas brasileiras e internacionais trabalhando junto a proprietários de florestas para remunerar a conservação e evitar o desmatamento, criando alternativas às queimadas para soja e pecuária.

O desafio atual do Brasil nesse contexto é comunicar melhor esse potencial, para capturar o vultoso volume de dinheiro que o mundo está disposto a pagar pela conservação da Amazônia. Os instrumentos e os caminhos, afinal, estão dados.

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